Eu confesso que ainda vou vivendo na ilusão de que este país funciona. Vou fazendo a minha vidinha normal, saio de casa de manhã, vou levar o garoto à escola, eu vou trabalhar, o big gajo vai trabalhar, regressamos os 3 ao final do dia, às vezes vamos às compras [ir às compras = abastecer a despensa], às vezes limitamo-nos ao básico, outras vezes temos de fazer uma ou outra despesa extra [seja roupa para o garoto que não pára de crescer, seja uma conta no mecânico] e assim vamos levando a nossa pacata vidinha. Hoje, por exemplo, decidi que não faço jantar e vou comer um hamburguer no intervalo das compras. E vou, e podia não ir e pensar que os 10€ que vou gastar me podem fazer falta amanhã. Mas ainda não cheguei lá. Ainda vivo a doce ilusão de que este país há-de pegar, nem que seja de empurrão.
Mas a verdade é que a minha cabeça começa a congeminar cada vez com mais frequência cenários preocupantes, negros, violentos até. Na verdade, isto está mais para afundar de vez do que para flutuar. Já não tenho segurança no emprego, o meu marido também não. Já não tenho segurança numa rede social de apoio, seja ela familiar ou diga ela respeito à Segurança Social propriamente dita. Já não vivo num estado-social. Já não vivo desafogada, vivo remediada. Já não tenho a segurança de um ordenado certo ao final do mês, "dê por onde der".
Começo a não acreditar que os problemas económicos e financeiros do país tenham uma solução pacífica. Adivinho muita contestação social a vir por aí. Revoltas, greves, motins, paralizações, uma guerra civil, uma Europa em guerra, uma guerra à escala mundial. Prevejo muitas dificuldades, muita pobreza. Começo a imaginar o cenário tantas vezes contado pelos meus avós, das filas para as senhas de produtos essenciais, que vão começar a escassear, a tornar-se inacessíveis para o comum dos mortais. Arrepio-me. Tenho um filho e arrepio-me. Os meus avós são todos vivos [e para mim seriam eternos] e não queria vê-los passar por tudo outra vez. Tenho medo do que vem por aí. Só não consigo prever quando exactamente, que prazo de validade enfrentamos.
No entanto, cruzo-me com as pessoas na rua e falamos dos mesmos assuntos banais, sorrimos, dizemos o clássico "vamos indo, que remédio". Mas será que vamos mesmo, será que vamos indo? E vamos indo para onde? E o que é que nos espera lá?
E logo à noite vou comer um hamburguer, porque me apetece. E amanhã, os 10€ que vou gastar podem-me fazer falta. E agora? Deixamos de consumir? Sentamo-nos todos à noite debaixo da manta, com o saquinho de água quente para não gastar gás, luz, lenha? Um país onde não há consumo, vai crescer de quê? Num país onde não há dinheiro, vamos gastar de onde?
Sou só eu que vejo uma pescadinha de rabo na boca?
11 comentários:
Vivemos no limbo :(
Concordo em absoluto com o que escreveste... tudinho, tudinho....
Só que eu já cheguei ao ponto de não comer o tal hamburguer, porque quero acender a lareira logo à noite... e não dá para as 2 coisas!!!
Infelizmente, para alguem como eu que adora Portugal e acha que o nosso país é maravilhoso... a solução é: emigrar!
Agora a questão é: poderão as remessas de emigrantes ajudar o nosso país como antigamente? Nesta europa de moeda única... não sei, não...
Saudosa, que pena tenho de não ter acesso ao teu perfil. não sei se tens blog ou não, mas se tens, gostava de conhecer :)
Pois, não acredito que as remessas emigrantes possam ser A solução... Já nem sei em que acredito...
Eu também concordo com tudo aquilo que dizes. Onde trabalho normalmente por esta altura há sempre muito muito trabalho e este ano nota-se bem a diferença. O problema é que isto vai sendo tudo uma grande bola de neve e no final de tudo não se sabe bem o que fazer. Eu acho que se tens a possibilidade de gastar os 10€ fazes bem. Eu fiz o mesmo na segunda-feira e pelas raras vezes que faço, soube-me pela vida.
A Side of me: hoje posso. Só não sei até quando...
Tânia: não sei como fomos do regular ao limiar em tão curto espaço de tempo...
Ni e é isso que me mete medo!
E se , por acaso, nem podermos ir ás compras :(
Merda é o que é
Não linda, não és só tu, mas que de facto temos que fazer contas temos!!! Quanto aos teus avós... tb a minha avó materna contou este fim de semana que tinham senhas para ir comprar o essencial e mesmo essencial não era o luxo de 1 kg de arroz por exemplo. Era sou 250 gr, ou 250 ml de azeite e não 1 litro.. Não tenho pena dos nossos avós, eles se tiverem que passar por isso já sabem como é... tenho pena sim dos nossos filhos. também tenho uma filha com 11 anos... e aqui em casa já se poupa há muito.. mas por vezes é dificil de explicar.. ela não entende!!
Tens toda a razão. Não sei onde vamos parar. Mas também temos de nos dar a algum luxo, nem que seja um hamburger, para nos sentirmos vivos e acreditar em alguma coisa, senão voltamos à miséria extrema. É triste o que se vive neste país e na europa. Mas o problema não está em nós trabalhadores, está nos governantes e se eles não se entendem? há crise. Sempre foi assim. Vamos esperar que o futuro não seja tão negro. Ah e eu espero que o hamburger te tenha sabido bem. Bj**
Tanita, soube-me pela vida e, para dois, só gastei 9.90€! :P
Nós agora - e tu sabes da nossa vida ;) - já chegamos ao ponto de todo o dinheiro ser contado. Não saímos de casa desnecessariamente para não gastar gasolina, não jantamos fora, não compramos nada que não seja estritamente necessário, não ligamos lareira, não se carregam telemóveis antes do prazo, não compro roupa (e só eu sei o quanto estou a precisar) porque simplesmente... não dá. Nunca tive ideias de sair do país e nunca fui apologista dessa opção para tentar salvar fosse o que fosse. O que é certo é que há uns dias dei por mim a ter essa conversa com o P.. É certo que de momento estamos mais apertados porque estamos a fazer um investimento a longo prazo... por agora há que aguentar, mas se no final de tudo não compensar é provável que venhas a ter uma amiga não no Norte de Portugal mas no Norte (ou Sul!) de qualquer outro país ;)
Um beijo enorme para vocês*
Igraine, tudo vai correr bem, só pelo simples facto de que vocês merecem!!!
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